domingo, 24 de julho de 2011

Ash Ra Tempel - Inventions for Electric Guitar






A experiência da própria vivência da escuta na música de Ashra. De imediato somos arremessados em camadas múltiplas de guitarras em delays de tempos diversos. O álbum todo é construído dessa maneira. Padrões que se repetem e dão lugar a outros padrões. Música, por assim dizer, minimalista. O material é restringido a um corpo de timbre específico circundado por uma idéia bem fixa de formas. Há três peças que compõem a obra. A primeira tem pouco mais que dezessete minutos. A segunda pouco mais que seis minutos. Finalizando, uma peça com pouco mais que vinte e um minutos. O que é que se inventa para a guitarra elétrica por aqui? A partir do pouco se inventa. É perceptível o distanciamento do que se espera de uma guitarra elétrica, quase sempre ligada à tradição negra da música norte-americana. O que podemos perceber aqui é uma gigantesca invenção mínima cujas nuanças vão se desvelando após longas escutas. Invenção aqui adquire o status de testamento de iluminação espiritual. Estamos em território cuja altitude é bastante elevada. Na primeira peça, por exemplo, encontramos quase nada de drive, a guitarra soa sempre cristalina, pois a invenção se dá em outro espaço, o tempo aqui se confunde naturalmente com o espaço. Como helicópteros melódicos em ondas incessantes de ecos. No último quarto da peça surge uma guitarra com drive mais acentuado evocando a vastidão de grandes vales geológicos. Erigidos em longas e extensas eras temporais. A saturação surge aqui como um espinho doloroso, nos lembrando da matéria, que não estamos apenas em território metafísico espiritual. Ao contrário dos anjos que perpassam a peça, ela também nos evoca o príncipe deste mundo. O que é necessário. Vence a matéria, a peça termina com o espinho proeminente. O segundo movimento dessa quase sinfonia evoca a solidão de um quasar no seio do universo em expansão. O leitor pode perguntar por que tantas metáforas astronômicas... Porque a cosmologia por mais que seja revestida de metafísica barata não deixa de ser matéria. A astronomia nos leva com suas explicações à pequenez e à santa finitude do que perece. “Quasarsphere” é como um Kyrie. O terceiro movimento, “Pluralis”, retoma os aspectos do primeiro, mas notamos aqui timbres sintéticos orquestrais espaciais perpassando a linha melódica que se repete. As orquestrações insistem num oscilação panorâmica bastante prazerosa, passando de um lado a outro nos gratificando com verdadeiras ondas de felicidade paisagística. As melodias nas seis cordas se desenrolam em arabescos que vão dos registros mais altos aos mais baixos enquanto as orquestrações passeiam flores de múltiplas cores. Faltando quase sete minutos uma onda de drive resplandece por entre as flores coroando com magnanimidade esta peça vasta em nuanças profundas. Com um grito de dor no seio da divindade. A sensação grassante das orquestras que adentram uma multitude de defasadores nos brinda com uma felicidade imensa, a felicidade que se pronuncia na paz. O órgão nos rememora de nossas origens do alto. Contentamento.

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